REMENDOS
JB Xavier
No tapete bordado
Que forra a estrada onde pisei,
Há fios de ouro, fios de amenidades,
Fios de acalantos, fios de sonhos,
Fios de lembranças...
Fios de saudades...
Teci-o todo
Com a delicada linha da esperança
Enfeitei-o, sempre que me foi possível
Com meu melhor sorriso, quando os tinha,
E cada passo vencido nesta vida minha
Caminhei olhando direto
Nos olhos do Futuro...
E tantos sonhos foram destruídos,
Tantos mais os repus em meu alforje,
Tantas lágrimas caíram,
Tantas mais cederam lugar a novos planos...
E do misterioso carretel de onde flui o Fio da Vida
Ora fluíam filigranas de ouro,
Ora toscos fios mal fiados
De desesperanças várias....
Mas tentei, em minhas andanças diárias
Dar a cada trecho deste tapete
O brilho de uma vida
Por onde viajei na mais completa consciência
De que atrás de mim ficaria minha história
E toda a glória, alcançada ou não,
Onde minha mão grossa de tapeceiro
Tentou trançar os fios da vida
De maneira elevada e cativante...
Por isso fiz de cada instante
Um momento eterno,
De cada amanhecer
Um grandioso milagre,
E mesmo das perdas,
Fiz reinícios audaciosos...
Das escuridões tormentosas
Fiz novos dias de auroras milagrosas
Que, como bálsamos, cicatrizavam minhas feridas....
Vivi muitas vidas numa só vida...
Vi, andei, toquei, ouvi e degustei
A seiva da mais pura existência,
Não no que ela tem de aparente, que é tido como real,
Mas do sonho, que é sua verdadeira realidade...
Cruzei a idade e senti cada fase da existência,
E quando olhei para trás,
Foi apenas para ver o tapete
Que lentamente eu bordava...
E ao olhar o mosaico de minhas realizações,
De meus ganhos, minhas perdas, minhas frustrações,
Percebo que muitas vezes me afastei do essencial,
Do eixo central
Ao redor do qual giramos todos
Na ciranda da existência...
E foi exatamente quando me afastei da essência,
Que pude perceber
O que significam a perda da inocência,
Do olhar límpido,
Do sorriso franco,
Do abraço honesto,
Da mão estendida...
E pude ver quão simples é a vida
Quando a despimos
Das vaidades que nos encerram em dor...
Pude ver que somente existimos
Quando tudo se reduz ao amor...
E no tapete bordado
Que enfeita os caminhos em que pisei,
Há lindos remendos
Feitos com fios de ouro,
Por todas as pessoas especiais
que me ajudaram a viver,
Que me fizeram ver
O valor da palavra “amizade”...
Elas consertaram os buracos que deixei,
Da ingratidão,
Da arbitrariedade,
Da inação,
Da insensibilidade...
Há remendos com fios de amenidades,
Fios de acalantos, fios de novos sonhos,
Fios de lembranças, de esperanças
E de saudades...
* * *