O Curso do Rio
Nunca pensei ocupar o espaço na vida, em que habito.
Para mim é uma total surpresa, afirmo.
Meus sonhos eram bem outros
E não poucos...
Sempre acreditei que viveria no mundo da música,
Até então, deusa única.
Nasci com essa convicção,
Pulsando não só na minha mente,
Mas resolutamente,
Em cada molécula do pulmão.
De certa forma, não estava errado.
Cantei minha vida inteira,
Mas, nunca me senti totalmente realizado.
Ora o repertório, ora os companheiros de palco,
Não me favoreciam o salto.
Fiz até, bons trabalhos,
Mas, nenhum representou aquele atalho,
Que tira do anonimato,
Num país superpovoado
De talentos de primeira.
Tenho que registrar que sempre privilegiei
A vida afetiva,
Sobre a carreira artística,
Sem, contudo menosprezar o palco.
Era o meu pensamento,
Naquele momento.
Passei também, anos inesquecíveis atuando no teatro!
Mas, vi Deus de tanto que amei...
Aprendi a amar incondicionalmente.
O que fez aflorar a minha sensibilidade, naturalmente.
O que veio a seguir,
Hoje me faz sorrir.
Nunca imaginei que me tornaria caiçara...
Por essa, eu não esperava.
Também não estava nos planos libertar-me das religiões,
Para ter as minhas próprias formas de celestiais conexões.
Tinha certeza que atravessaria a vida acompanhado.
Esse engano, ainda me deixa meio acanhado...
Mas, é muito estreito o fio em que vivo.
É melhor atravessar sozinho...
Quem diria
Que eu, radicalmente, rejeitaria
Os ditames da burguesia,
Com sua famigerada hipocrisia.
Além disso, acabaria virando um combatente,
Um inimigo do capitalismo inconsequente,
Do injusto, mas conveniente,
Do poluto, do demente.
Sigo quixoteando!
Aos acomodados, incomodando...
Por último: o principal,
O essencial,
É ter aflorado a poesia
E sua incomparável melodia.
Ela assumiu a frente de tudo,
Mostrou-me as vantagens do profundo.
Pacificou-me,
Intensificou-me.
O homem, agora poeta,
Caminha em linha reta.
Está seguro,
Em seu fantástico mundo.