EXISTIR...
Existir...
É não se encantar
Com o abrir meticuloso
De uma flor pela manhã,
Beijada pelo audacioso orvalho
Que a conspira...
Existir...
É não ter um segundo para
Presenciar e se envolver
Na beleza do pôr-do-sol,
Que renasce em todo o amanhecer,
O mesmo, todos os dias...
Existir...
É caminhar sem sentir as pedras,
É envelhecer sem ter histórias para contar,
É fechar os olhos e não sonhar,
É o encontro de lábios opostos sem desejo,
É a digital de um corpo noutro sem êxito...
Existir...
É dedilhar a face e não recolher a lágrima,
É repousar sobre um peito contrário
E não sentir a sandice da febre,
É o beijo que pede em meios delírios
Um intervalo negativo,
É não ouvir o ruído dos corpos desiguais,
Esculpindo sem pudor todas as formas de amar...
Existir...
É olhar para o horizonte e não ver
O sono profundo da tarde dourada,
Que se deita femininamente nos braços
Calmos da noite...
Existir...
É sentir medo de amar,
É definir o tempo,
É não se permitir ser tocada
Pelo o vento,
Com medo do frio...
Existir...
É existir.
E existir apenas não basta,
É preciso viver,
E viver...
Sem tempo para o simplesmente
Existir...
Poesia publicada no livro: “Afeições”, de Andréa Pelegrinelli, Editora Scortecci (2000) – pág: 24.