O CEGO, CEGO (Cena do cego que não vê com o cego que acha que vê)
(Cena do cego que não vê com o cego que acha que vê)
Por não ver o alvor fenecendo
Por fantasiar a áurea do sol surgindo
Não me faz tão magoado.
Sinto-me consolado mais assim
Mesmo não contemplando a criatura
É singelo testemunhar o seu Criador.
Sem O vê, O vejo dentro de mim
E você? Olha só por olhar
E não vê a natureza desfilando
Por não ver o céu estrelado
Não me faz em nada entristecido
A mim é mais do que bastante
Saber que lá estão elas
Desordenadas, às vezes em paralelas
Guiando cá o meu destino
E você vê a Dalva por estar por perto
E não vê a mais bela, aquela mais distante
E não vê a natureza desfilando
Não ver a beleza da flor
Invejar do beijo do beija flor
Saciando a sua sede
Não me atormenta tanto.
Sinto o doce do seu perfume
Sinto o seu espinho protetor.
E qual o cheiro da sua flor?
Se flor você não vê e nem flor você tem
E não sente a natureza perfumando
Não me angustia em não ver
O leito correndo em liberdade
Abeirado pela floresta viva
Saciando o campo sedento
E depois de longa estrada
Descansar em outras águas.
Entristece-me a hostilidade do ímpio
Maculando sem dó, sem piedade
Envaidecido vê a natureza desvirginando
Sentirá saudade do brilho do sol
O seu céu não terá mais estrelas
A flor não sentirá o beijo do beija-flor
O rio não chegará ao seu destino
Eu cego solitário conversarei com o meu mundo
O mudo ímpio não tem mais o que falar
Levanta às mãos em súplica
Suplicando uma migalha de vento
Vendo-o assim me faz melhor não enxergar