EXAME DE CONSCIÊNCIA
Hoje é o Dia da Consciência Negra.
Você, que detesta pretos
Será que tem coração?
Perdido em um coreto
Gritando: “Separação”!
Você e eu, todos nós
Repletos de preconceito
Erguendo a nossa voz
Falando assim desse jeito
Como se eles fossem lodo
Somente por sua cor
Com petulância e arrogância
Desdenhamos seu valor.
Seguindo assim pelo mundo
Com essa soberba vã
Taxamos negro de imundo
afastando a pele irmã.
Mas fico pensando agora
e quando chegar minha hora?
Ah, meu Deus! E se eu morrer
Hoje, agora, amanhã?
Num'a viagem esquisita
Com gente feia e bonita
Lá eu fosse recebida
Sem ser amada ou querida
Por um porteiro aleijado
como aqueles que eu gozei?
Viesse abrir a porta
Olhando minha vista torta
Igual a que eu critiquei?
Se a sua mão calejada
Tateasse pela entrada
Como as mãos de muitos cegos
Que eu nunca ajudei!
Se os choros que provoquei
Ecoassem em meu ouvido
Mostrando o quão iludido
Eu fui pela vida afora
Se uma criança agora
Me tomasse pela mão,
Entoando uma canção
Daquelas que eu não cantei
E sorrindo me levasse
Por um corredor florido
Perfumado colorido
Com flores que eu não plantei?
Se eu sentisse o chão frio
Me provocando arrepios
Como aqueles dos presídios
Que eu jamais visitei?
Se eu visse cair as paredes
De orfanatos e creches
Que eu nunca ajudei?
E se a criança tirasse
Os corpos pelo caminho
Que eu, ser muito mesquinho
Corpos que eu não levantei
Dizendo que eles eram
Epiléticos, embriagados
E os deixava jogados
Largados pelo caminho
Que ser humano mesquinho
Atende pelo meu nome
Julguei fossem vagabundos
Mas era somente fome!
Meu Deus!
Que fiz eu?
Agora me envergonho
Em pronunciar seu Nome.
E se mais um pouco adiante
A criança num rompante
Cobrisse o corpo nu
Da prostituta que eu usei
Do pobre que eu não olhei,
Da idosa que ignorei
Da mulher que eu desrespeitei
Ou da mãe que nunca amei?
O corpo de alguém exposto
Largado ali na calçada
Jogado por minha causa
Pois não estendi a mão
Magoei-lhe o coração
Sei lá, eu só dei desgosto?
E no fim do corredor
Vejo meu livro exposto
Inicia a decepção.
Que raiva, que desespero,
Se eu visse o mecânico
O operário, o vizinho
O maldito funcionário
E até mesmo o padeiro
Sorrindo todo faceiro
Todos riem, não sei de quê
Ah! Sei sim
É da minha decepção.
Deus não está vestido de ouro. Mas como?
Trajes de couro?!
Tão simples como eu não fui
Humilde como eu não sou
Debochei até do amor
Deus na cor que eu não queria,
Deus nas faces que eu não via
E sem a classe imponente
Deus simples! Deus negro!
Deus negro?
E Eu…?
E agora eu descubro
Que sou um trapo de gente
Fui racista e egoísta
E só soube perseguir
Naquela pessoa preta
Tinha prazer de cuspir
Nunca lhe dei um sorriso
Nunca lhe apertei a mao
Mas meu Deus, você é negro!
Tremenda decepção!
Eu aqui vou ter morada
Ou vou dormir na escada?
Que nada!
Ele vai me dar apenas
Aquilo que eu plantei
Ao preto não empreguei
Somente o rosto virei
Será que me dá um canto?
Ou me cobre com seu manto?
Acho que vai me lembrar
Da bofetada que eu dei.
Eu não podia adivinhar
Que eu ia te encontrar
Naquele preto engraxate
Que da minha porta expulsei.
Pregaram você na cruz
E você me prega uma peça
Eu me esforcei a bessa
Mas não acertei em nada
Apenas dei gargalhada
Se me falavam de amor.
Hoje sei que não sou nada
Pois via somente a cor .
Autoria da professora Alba, poetisa do entorno.