MÃE
Se ficava com fome, ela me alimentava,
Se ficava nervoso, ela me acalmava,
Se sentia dor, ela me abraçava
E miraculosamente, a dor passava.
Quantas vezes triste eu chorei,
Magoado e humilhado solucei,
Quantas lágrimas ácidas derramei,
Sentindo-me fracassado, desesperei.
Ela sempre tinha uma palavra
Ou uma música me ensinava,
Às vezes simplesmente me olhava
E lágrimas sincronizadas derramava.
Às vezes dor de barriga eu sentia,
Às vezes com febre eu caía,
Na cama enfermo eu padecia,
Mas ela uma solução me trazia.
Ela me oferecia um chá
Ou uma sopa iria preparar,
Sua atenção era pra já,
Um carinho pronto a me dar.
Mas eu sofria muito mais
Quando a via ali triste demais,
Daria tudo para aliviar seus ais
E sofria mais por me sentir incapaz.
Quantas vezes pedi fortuna,
Mas não tinha coisa alguma,
Queria ajudar de forma oportuna
E preencher, na vida dela, a lacuna.
Justificava essa minha dificuldade
Usando como desculpa minha idade,
Dizia: “Um dia irei para a cidade
E trarei pra ela toda felicidade”.
Da parte dela nunca dizia talvez,
Não deixava para o próximo mês,
Sempre dava um jeito, por sua vez,
Para tudo resolver como sempre fez.
Não podia comprar, se punha a plantar,
Não tinha dinheiro, se punha a trabalhar,
Não havia o que fazer, se punha a orar,
Não tinha solução, ela iria buscar.
Se alguém dissesse: “Não tem jeito!”
Ela contrariava esse sujeito,
Se alguém dissesse: “Não há proveito!”
Ela transformava esse conceito.
Para ela pedra podia dar leite,
Água transformava em azeite,
Usava tudo que se aproveite
E o fazia para nosso deleite.
Se ela dissesse: “Vai chover!” Chovia,
“Vai esfriar!” A temperatura caía,
Se dissesse: “Vai acontecer!” Acontecia,
“Não vai dar certo!” Então eu desistia.
Semianalfabeta, mas era mestra,
Não estudou música, mas maestra,
Tinha destreza de canhota e destra,
Confeccionava bolos e fazia festa.
Se faltasse algo, ela produzia,
Se faltasse luz, ela mesma reluzia,
Se faltasse direção, ela conduzia,
Se faltasse ajuda, a mão estendia.
Mas faltasse justiça, batia o martelo,
Faltasse respeito, bradava o chinelo,
Faltasse caridade, sinal amarelo,
Mas sempre corrigia com muito esmero.
Dizem que mãe é tudo igual,
Fazem as mesmas coisas e tal,
Só de endereço mudam por sinal
E para os filhos não querem mal.
Mas não há quem possa substituir
Uma mãe que veio a existir
E quando a sua precisar ir
Com certeza o seu mundo vai ruir.
Hoje sinto falta, tenho saudade,
Sua presença era de qualidade,
Seu conselho, uma preciosidade,
Suas ações, pura caridade.
Sinto falta do seu jeito,
Como me apertava em seu peito,
Lembro que me fez ver em seu leito
O quanto eu era tão imperfeito.
E naquele quarto como numa cela,
Enquanto a luz entrava pela janela,
Vi a alma se despedindo dela
E nunca mais veria cena como aquela.
É muito humilde esse poema
E não expressa a grandeza do tema,
Mas é o sentimento de quarentena
Que flui desta minha alma pequena.
Se pra ela pudesse ler esta mensagem,
Não sei se teria coragem,
Pois essas palavras pareceriam bobagem,
Se não estivem gravadas como tatuagem.
Aberio Christe