Canto da Ressurreição

Miguel Lucena

Ao Dia da Consciência Negra, uma homenagem ao líder, primeiro mártir da liberdade, Zumbi dos Palmares:

A notícia espalhou-se como vento.

De boca em boca, correu as senzalas.

Na casa grande - cozinhas e salas -,

nas igrejas, bares e conventos,

nos canaviais e acampamentos,

falava-se que o Rei fora dormir.

Virara espírito, bem longe daqui,

orixá, caboco, o quilombola.

Reza o feiticeiro, a alguém consola:

- Ressurge o Rei Zumbi, óia Zumbi.

Zumbi, Zumbi, óia Zumbi!

O canto encanto da ressurreição

balança a mata, sopra os palmeirais.

Ó neto de Aqualtune, onde estás?

Teu sonho é mais forte que o tufão!

Um Deus da guerra - raio e trovão -

não morre jamais. Volta à Nação

Nagô, a Angola da África, da magia.

Dono do mar, reme o barco da poesia

da luta até o céu da liberdade.

As ondas do mar te levam à felicidade,

quebrando as correntes da agonia.

Fim do século XVII, era novembro.

E, por mais que espalhassem em cada porto

a notícia de que Zumbi estava morto,

separado em cabeça, tronco e membro,

ninguém acreditava. Era dezembro

e danças, capoeiras, brigas,

rezas, santos negros, figas

davam forças pra lutar ao Rei da Guerra.

E os prantos que caíam na terra

vinham acompanhados de uma cantiga:

Zumbi, Zumbi, óia Zumbi!

E o som de mais de mil tambores

ecoou em outros continentes.

Confundia-se à quebradeira de correntes

e aos gritos de alegria, findas as dores.

Um aroma leve e bom de flores

que o rei trazia na lapela

inspirou Desmond Tutu numa capela

e ao povo se juntou Desmond Tutu.

Óia Zumbi, canta África do Sul!

Óia Zumbi, Óia Zumbi, Nelson Mandela!

Miguezim de Princesa
Enviado por Miguezim de Princesa em 20/11/2008
Reeditado em 20/11/2008
Código do texto: T1293179