Sonho Meu
sonho meu
Um sonho me compraz, e o acalento,
Como algo valioso inatingível e belo,
A ele alimento, e cuidadoso o velo,
Pois que é da minha vida todo alento.
Se a dormir eu o sonho, sigo atento,
Todos os seus detalhes, e meu desejo,
Maior de então é ver tudo que vejo
Realizar-se ali, em um momento.
Em devaneios, às vezes em pleno dia,
Desperto e lúcido a ele me transponho,
Ali então, tal como em pleno sonho,
Revejo-lhe os detalhes com alegria
Vejo de olhos abertos, uma choupana,
Tão pequena , tão rústica, sem pinturas,
Toda porém cercada das verduras
De pomares, de hortas e de canas.
Vejo-me Ancião, sedosa cabeleira,
Branca como algodão dançando ao vento,
Que como um jovem cheio de alento
Escala ágil, os galhos da mangueira.
E lá no cimo, brancas barbas hirsutas,
Tingidas de amarelo, lambuzadas,
Pelas caldas que escorrem adocicadas
Dos pericarpos carnudos destas frutas.
Já bem desperto, assim que o dia novo,
Cobre com seu rubor o horizonte,
Nas cristalinas águas duma fonte,
Fazendo minha ablução, a Deus eu louvo.
Apanho a lenha, e a racho a machado,
Feito o fogo, lá ponho uma chaleira,
E com galhos aromáticos de cidreira,
Faço meu chá e o adoço com melado.
Sigo então para a horta, ela é tão bela,
Que só possa existir talvez no sonho,
Legumes e verduras, a cesta os ponho,
E a transformo em um quadro de aquarela,
Meu modesto pomar talvez nem deva,
Ser chamado pomar, de tão modesto,
São só dez árvores, mas como todo resto,
De tão bonito a minha alma enleva.
Cerca-me toda a casa, e logo à frente,
Ergue-se a frondosa e vetusta jaqueira,
Tendo a direita uma velha mangueira,
Cujo sabor dos frutos é excelente.
São Itamaracá, mangas formosas,
Sempre tão verdes, grandes, e polpudas,
Todas cheias de fibras, até peludas,
Grossas cascas macias e leitosas.
À esquerda da jaqueira, um cajueiro,
De fronde bem copada verde vivo,
Protege meu barraco, sempre altivo,
Das rajadas geladas do “norteiro”.
Há a direita da casa, no terreiro,
Sete arvores, a saber: a outra mangueira,
Os dois abacateiros, a gravioleira,
Dois pés de atas e o outro cajueiro.
À esquerda da casa os jasmineiros,
“Só três”.Copados e floridos, de três cores,
Vermelho, branco e rosa, enchem de olores,
A casa Os traz os ventos passageiros.
Atrás da casa sob o velho telhado
Fica meu cacimbão, meu velho poço,
De águas límpidas onde sempre ouço
Gemer o carretel pouco engraxado.
Ao chão calçam tijolos de adobe,
Dos mesmos das colunas do telheiro
As quais, sombra e umidade, o ano inteiro,
Dissolvesse-lhes o reboco, e o limo sobe.
Atrás da casa, em terra preta pura,
Há um roçado bom de lindas de canas,
Só canas de primeira, só caianas,
Boa para garapa e rapadura.
Mais à frente, em terras pouco planas,
Plantei diversas e lindas bananeiras,
Que são agora dezenas de touceiras;
E produzem milhares de bananas.
De quatro tipos as plantei, todas gostosas,
Que são:... A prata, a comprida e as maçãs,
E uma touceira de grandes pacovãs
Com seus bonitos cachos cor de rosas.
Já mais abaixo, a cem metros da nascente,
Onde as águas do córrego murmurejam,
Ficam as leiras da horta que vicejam,
Por todo o ano, incessantemente.
Ali há flores em qualquer recanto
De todas as cores, indescritíveis, belas,
Inebriantes olores emanam delas,
Que inebriam minha alma como encanto.
A casa dos meus sonhos e as cercanias
São por certo o paraíso, e descrevê-las,
É me impossível tanto como tê-las,
Na mediocridade dos meus dias.