O idiota contemplador de desimportâncias

Sou contemplador de coisas desimportantes.

De casca de cigarra presa à árvore.

De semente levada pelo vento.

De trieiro de formiga-cortadeira.

Da engenhosidade de alguns ninhos.

Do rastro brilhante da lesma.

Da resiliência das pedras.

Dos desenhos bordados na areia da estrada,

feitos pelas pegadas de passarinhos e insetos.

Das gotas de orvalho na teia de aranha.

De casa de joão-de-barro.

De poça de flores sob as árvores.

Do levar das folhas pelo vento.

Daquele raio de sol,

que entrando no quarto escuro

pela fresta da janela,

empresta luminescência

às partículas de poeira em suspensão.

De cheiro de brejo e de chuva.

Das formas das nuvens.

De rebento rachando a terra.

De preguiça de gato sob o sol.

Da música do riacho a correr pelo chão.

Do voo da libélula.

Das cores do ocaso.

Do musgo agarrado às árvores.

Da pomba bebendo água.

Do pardal brincando na areia.

Dos raios solares escapando por trás das nuvens.

Alcunharam-me idiota, por contemplar tais coisas,

Tomei isso como elogio e sorri,

Ninguém entendeu nada...