'Eu sou a morte'
"Escrever sobre os humanos é o que ainda me deixa são,
1400DC ao pôr do sol de hoje"
Quando Maria-Flor se foi, levou consigo todo jardim, deixando-o a beira de um deserto de desilusões, deixando terra improdutiva e um punhado de sementes meio mortas, houve seca, apenas lá em cima do que fora um jardim e jaz um deserto de cadáveres. Maria-Flor havia roubado a vida de seu pequeno jardim de flores coloridas, conseguindo assim roubar a esperança de olhar pela janela e ver futuro nos verdes campos que ele admirava durante as manhãs. Maria-Flor roubou-lhe o sol, roubou-lhe as cores, roubou-lhe a vida.
Meses de angústia me aproximaram de Zé-Antônio, admirava-o todos os dias com aqueles olhos marejados e cuca confusa. Até o dia em culminaria sua morte. Aflito e repleto de desilusões, Zé amarrou a corda na viga principal de sua sala, pensou ele: - terei a morte diante de meu jardim que não mais existe. E assim ele o fez.
Produziu o "nó carrasco" e em poucos minutos estava posicionado de onde daria cabo de seu sofrimento, ali já não havia esperança, a morte seria se refúgio. Abarrotado de lágrimas que não chorava haviam dias, Zé se entregou a elas; nesse momento um feixe de sol atravessou as nuvens e por poucos segundos o cegou, atônito pela luz inesperada, ao longe de seu jardim descampado, Zé avistou um broto verde, um caule minúsculo que acordava lá longe, entre duas pedras que marcavam o final de seu jardim-de-flores-mortas.
A esperança voltará aos olhos de Zé, havia o brilho de quem [re]encontra o amor inapercebido. Havia vida naquelas terras áridas que era Zé.
Maria-Flor havia quebrado em tantos cacos seu coração, que o matuto virou sertão e desacreditou que havia possibilidade de haver outra vida, mas houve, sempre há.
No meio de duas pedras esquecidas nascia Rosa-Morena, vítima das canções serenas e do amor inalcançável que Zé achava não mais existir.
"Então me propus a escrever,
uma história de amor tão triste,
tal vil e mordaz.
E mais uma vez virei escritor,
meu nome? Não sei de fato o teor,
perdi a noção de tempo com as eras;
Muitos me temem, outros me esperam.
Eu sou; eu era; e eu serei.
Um dia volto pra contar sua história talvez.
Tânato me chamo,
sou o lado oposto da vida.
'Eu sou a morte'
Paschoal, George