Neste acreditar sem fé

depois do tudo que é,

sem bom dia e sem abraços…

creio antever o que ira ser

nada será como é, e tudo será novo depois

acontece-me às vezes,

e sempre que acontece é quase de repente,

surgir-me no meio das sensações um cansaço

tão terrível da vida, do que já foi,

não há sequer hipótese de um acto

de beijo, de contacto

como dominá-lo? esse desejo de afecto

essa vontade de ter, de receber de gastar e esbanjar

o que hoje não tenho, não temos…

para o remediar o suicídio parece incerto,

a morte espreita, mesmo suposta, a inconsciência,

há um toque fútil que contamina…

ainda pouco, um cansaço que ambiciona,

agarrei-me ao varão para o saber existir

— o que pode ser ou pode não ser possível

se doente estou porque vivo

e se de morto caminhante não passo…

neste acreditar sem fé

morro a cada dia, a cada instante…

Alberto Cuddel

22/03/2020

04:44

In: Nova poesia de um poeta velho

Alberto Cuddel
Enviado por Alberto Cuddel em 01/06/2020
Reeditado em 01/06/2020
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