Velha âncora

Sou uma velha âncora esquecida...
Um velho almirantado
numa sucata de ilha, abandonada.
Vestida de ferrugem.
Trago ainda, nos braços, salsugem
dos mares mais longínquos deste mundo...
E já sondei o fundo mais profundo
d’alma azul do oceano...
Muita vez, conduzida a todo pano,
beijei-lhe a face líquida e enrugada
e, suspensa e oscilante,
fui lágrima de ferro pendurada
nos olhos de escovéns de um brigue errante.
Onde estará o meu barco?
Em que porto adormeceu para esquecer a vida?
Tudo rolou para um passado morto...
Sou uma velha âncora esquecida.

(Inscrição no Museu de História do Mar, em Lisboa)