O testamento
O papel amassado
escondia farelos de pão.
O papel agastado de dores
ferido a grafite,em letra graúda,
repousava miúdo, escondido
por trás da moldura da Santa Ceia...
Que sempre ficava na parede...
-Acho que a danada ta chegando...
Todo dia dói o dia todo...
-Dondinha!Vou sentir tanta saudade...
Mas depois vai ser aquele descanso!
E até uma boca a menos...
-Acho que ela tá chegando...
-Dondinha... Cuidado com as meninas...
O Rinaldo é homem, é diferente, você sabe...
Não deixe de pagar a conta de seu Nicanor.
Olhe, nunca esqueça de dona Corina:
ela ajudou tanto Nem naquele dia...
Vamos perdoar Toinho:
a gente também erra!
-Quando eu for, minha velha,
me veste na roupa nova...
Aquela do São João!
Não quero a sandália franciscana, não.
Quero o meu chinelo...
Tá lembrada, Dondinha,
ganhei lá na quermesse da igreja...
-Ai!essa dor me dói...
-Dondinha, quando eu morrer
não chama ninguém não, lá da fábrica...
Lá eu só tenho amigos...
E isso não é festa que eu dê pra eles...
-Tá bem,Dondinha, mande rezar a missa!
Mas pede a padre Jesuíno
pra não falar muito de mim.
Faz só a recomendação...
-É tarde, Dondinha!
E essas besteiras vão ficando por aqui...