SAUDOSO FADO

A canoa vai cortando manso

as águas turvas do remanso.

A saudade vai remando na proa,

comandando o rumo da canoa.

O barulho do remo nas águas

é cantiga de ninar que compraz,

é brisa fresca do orvalho que cai,

é chuva fina que molha meus ais!

O balanço suave que o rio provoca

é vai-e-vem da alegre dança de roda,

é linguagem que evoca o sagrado,

é ginga profana do corpo suado.

O traço comprido do horizonte

avança rumo ao cume do monte

e perde-se no denso verde das matas.

Desalentado, o coração canta um fado.

O ruído do vento acompanha o canto

e se soma ao dó maior do pranto

que escorre em salgadas gotas

pelas sendas do agreste rosto.

A canoa já não singra rio caudal

mas águas do meu rio sentimental.

É o fado triste que comanda a proa

e vai levando, lento, saudosa canoa

carregada de pesaroso penar!