O Último Ato

Uma garra agarra e rasga a crisálida

Onde dormitava o deus do dia.

Apolo, com loiras melanias,

Beija a corola da rosa cálida.

Os dedos rosados da Aurora

Abrem as ventanas do mundo.

Desperta num suspiro profundo

A última estrela que vai embora.

A luz penetra coada pela copada

Das árvores tropicais e toca o chão.

Os seres do dia, como uma oração,

Assistem os resquícios da madrugada.

Os feixes dourados argentam a relva

Perolada pelo orvalho santo e sereno.

Pássaros quebram a mudez da selva

Mostrando como este mundo é pequeno.

Se tudo é renascimento e renovação

Qual o motivo de tudo ser tão fugaz?

Se se adora a aurora de cada dia

Porque um dia não nascerá mais?

Se tudo é sol reverberando magia

Qual o motivo de tudo ser efêmero?

Se já nascemos escrevendo o destino

Quem seria o autor destas páginas?

Se tudo é tato, olfato e palato

Qual o motivo dessa insipidez?

No mundo do quem sabe, do talvez,

Qual de nós seria o mais sensato?

Ah! Por pouco não morro ou não mato!

Indagações que insistem em furtar a alegria

Que me domina ao raiar de um novo dia.

Fechem as cortinas! É findo o último ato.

Gil Ferrys
Enviado por Gil Ferrys em 04/07/2016
Reeditado em 04/07/2016
Código do texto: T5687569
Classificação de conteúdo: seguro