Marinheiro
Passei por aqui
Como já não podes ver
O que estou vendo
Vejo por ti.
Por ti eu vi os barcos de nomes líricos,
Os velhos navios da Costeira e do Lloyd,
Os vapores da Companhia Comércio.
Por ti eu vi os marinheiros espalhados
Nos botequins da Saúde, contando casos,
Pródigos no oferecimento de bebidas.
Por ti eu vi, numa noite fria e úmida,
Os lampejos do farol da ilha Rasa.
Por ti eu senti o cheiro da maresia
Num crepúsculo à beira mar.
Por ti eu senti o cheiro da maresia
Num crepúsculo à beira-mar.
Por ti eu imaginei rumos audaciosos,
Travessias de oceanos, surpresa
E encantamento de novas paisagens.
Por ti eu me investi na função de comando,
Traçando roteiros, consultando mapas,
Empunhando binóculos,
Vendo o clarão das cidades do litoral.
Por ti entoei velhas canções de nautas
Saudosos de terras distantes.
Em homenagem a tua memória
Consegui conter as lágrimas
E reprimir a revolta causada por tua morte.
Hoje te quero e te compreendo
Muito mais do que nas horas
Em que tua presença física
Vinha atenuar as saudades de meses
E meses de ausência nas tuas prolongadas
Viagens em navios que ainda hoje
Parecem te esperar.
Irmão marinheiro,
Os barcos ainda te reclamam através
De seus apitos pungentes.
O ranger das trancas nos iates a vela
É o lamento de quem ainda não se acostumou
Com a tua súbita partida para o nunca mais.
E há marinheiros de fisionomias espantadas,
Eles que relutam em acreditar
Que não ouvirão mais tua voz de comando,
Teu jeito brando e determinado
De dirigir e ordenar, tu, que a bem dizer,
Morreste no leme do teu barco.