MAMÃE NA ROÇA
Sandra Fayad
Na roça, mamãe era importante, famosa, respeitada
como se fosse prefeita, doutora, rainha.
Mamãe usava óculos, sabia ler e escrever a lápis, com giz e com caneta.
Entendia sobre o que falavam no rádio e escreviam nos livros.
Na roça, mamãe ensinava aos meninos pequenos e aos grandes:
pegar no lápis, desenhar o nome, ler o be-a-bá na cartilha Sodré,
fazer contas de mais e de menos e até de multiplicar e dividir.
Ensinava às meninas usar calcinhas por baixo das saias rodadas de chita,
escovar os dentes, cortar os cabelos, eliminar piolhos, vestir-se.
Na roça, mamãe era ouvida. Falava como se fala na realeza.
Dizia “Você” ao invés de “Ocê”, “Pra cima” no lugar de “Pra riba”,
“Vamos almoçar” quando a “boia” estava pronta “pra cumê”.
Aliás, mamãe não chamava: “convidava” para sentar à mesa.
Na casa da mamãe, havia remédios de farmácia.
Havia também remédios “amostra grátis”,
que seu irmão médico ganhava dos viajantes
e guardava para doar-lhe quando fosse à cidade.
Mamãe lia a bula, explicava tudo antes de dá-los aos roceiros.
Mamãe ia à cidade receber seu salário de professora rural.
Era dinheiro de verdade, que ela mostrava ao povo da roça.
Sem dar importância, olhavam as notas. Aquilo era anormal.
Lá ninguém precisava daquilo. Tudo era barganhado ou dado.
As mulheres da roça queriam ficar perto da mamãe.
Com ela aprendiam a cuidar da própria saúde,
Exigir respeito dos homens, lutar por uma vida melhor.
Ajudavam mamãe nas tarefas domésticas, que sabiam de cor.
Na roça, mamãe também aprendia.
Aprendia a fazer farinha, beju e queijo,
fiar algodão, tecer cobertores, fazer sabão.
Aprendia também a ler o que não estava escrito.
Na roça, mamãe plantava, plantava...
E colhia.
Bsb, 10-06-2014
Respeite os direitos autorais. Ao citar informe a autoria e a data da publicação. Peça autorização à autora para copiar.
Visite meu site: www.sandrafayad.prosaeverso.net
Sandra Fayad
Na roça, mamãe era importante, famosa, respeitada
como se fosse prefeita, doutora, rainha.
Mamãe usava óculos, sabia ler e escrever a lápis, com giz e com caneta.
Entendia sobre o que falavam no rádio e escreviam nos livros.
Na roça, mamãe ensinava aos meninos pequenos e aos grandes:
pegar no lápis, desenhar o nome, ler o be-a-bá na cartilha Sodré,
fazer contas de mais e de menos e até de multiplicar e dividir.
Ensinava às meninas usar calcinhas por baixo das saias rodadas de chita,
escovar os dentes, cortar os cabelos, eliminar piolhos, vestir-se.
Na roça, mamãe era ouvida. Falava como se fala na realeza.
Dizia “Você” ao invés de “Ocê”, “Pra cima” no lugar de “Pra riba”,
“Vamos almoçar” quando a “boia” estava pronta “pra cumê”.
Aliás, mamãe não chamava: “convidava” para sentar à mesa.
Na casa da mamãe, havia remédios de farmácia.
Havia também remédios “amostra grátis”,
que seu irmão médico ganhava dos viajantes
e guardava para doar-lhe quando fosse à cidade.
Mamãe lia a bula, explicava tudo antes de dá-los aos roceiros.
Mamãe ia à cidade receber seu salário de professora rural.
Era dinheiro de verdade, que ela mostrava ao povo da roça.
Sem dar importância, olhavam as notas. Aquilo era anormal.
Lá ninguém precisava daquilo. Tudo era barganhado ou dado.
As mulheres da roça queriam ficar perto da mamãe.
Com ela aprendiam a cuidar da própria saúde,
Exigir respeito dos homens, lutar por uma vida melhor.
Ajudavam mamãe nas tarefas domésticas, que sabiam de cor.
Na roça, mamãe também aprendia.
Aprendia a fazer farinha, beju e queijo,
fiar algodão, tecer cobertores, fazer sabão.
Aprendia também a ler o que não estava escrito.
Na roça, mamãe plantava, plantava...
E colhia.
Bsb, 10-06-2014
Respeite os direitos autorais. Ao citar informe a autoria e a data da publicação. Peça autorização à autora para copiar.
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