Dor e tempo
Oh dor maciça! Indelicada e irrequieta,
Curta e precisa, que atina e devaneia
Teces com fúria a tua dócil teia
Mas repudia quem nela se injeta.
Dor matutina a serpentear na veia
Quando enfadonha a mente se estreita
Serena e lisa, ficas na espreita
E sem caminho fica quem se enleia.
O tempo amigo também é derradeiro
E não se espera mais de onde ele veio
Chega com graça e mete lhe o arreio
Depois despede-se frio e matreiro.
E assim se torna o fado suportável
Com a esperança do que vem depois.
E o que ontem era um hoje são dois,
E encontramos um nível mais estável.
Porém a vida vem cobrar ou a morte,
Ou na medida incerta, a má sorte
E pisa duro os cascos na areia
E o castelo de pronto se desmancha
Lágrima e fel desse ruir deslancha
Sobra só o lamentar da dor alheia!