À NOITE
A noite esconde um barulho
Medroso, quase homem
Escondido no embrulho da fala
Papel de seda
Com aroma de desejo
Animal sem pele
Grito sem som
Gemido escondido nas paredes
Dos quartos
(como se não houvesse)
Na noite se esconde um
Barulho infantil, que pula
Na sala,
Liberdade sem cerca;
Barulho sem manobra
Que exala desejo nos poros
Todos
Como fogo nos gravetos
Nas secas do meu sertão;
Lá as sementes vingam e morrem
(noite adentro)
E florescem
Sempre filhas da noite
Em pele de animal
Sem corar o rosto
Sem cobrir o corpo
Sem medições
À noite os teatros se mostram
As máscaras correm afoitas
Para o armário
(agora plateia)
Seus olhos perambulam pelas camas
E se fecham
Pela sarça ardente
E descansam exaustas dos imbróglios
Dos acordos
Dos conchavos
Dos ditames
Das condutas
Dos indultos
Dos comandos, dos contornos, dos contextos
Dos preconceitos...
Os teatros se fecham à noite:
O alívio sobe à cama
Os delírios se aninham
Os gemidos se amontoam
Os desejos se avolumam
(matreiros, quase paternos)
Os corpos se enlaçam
(biblicamente, até)
As carnes se completam
A arte se derrama em fogo brando
...À noite.