Lápide

Debaixo daquela árvore eu pensei em nós,

cultivei saudades e remoí (re)sentimentos.

Debaixo daquela árvore eu fiz amor contigo,

briguei com o mundo, desprezei verdades.

Debaixo daquela árvore eu escrevi um livro,

fotografei memórias, pintei sonhos, rascunhei o amanhã.

Debaixo daquela árvore eu ouvi das guerras,

das atrocidades mundanas, das violências gratuitas. Do homem.

Debaixo daquela árvore eu acreditei em Deus,

cuspi nos santos, maldisse a fé, escarrei vilepêndios. Praguejei.

Debaixo daquela árvore eu tratei da mente,

esqueci o passado, revigorei o presente, parei com o futuro. Chamei por Ele.

Debaixo daquela árvore eu casei de novo,

eu amei de novo, sofri de novo, morri por dentro.

Para o amor.

Debaixo daquela árvore eu contei histórias,

embalei teu sono, violentei meus medos, sorri de tudo. Queria abrigo.

Debaixo daquela árvore eu catei os escombros,

afastei as moscas, aparei arestas, escutei o silêncio.

Ele falava de dor.

Debaixo daquela árvore eu nasci com o sol,

cantei para a lua, decifrei segredos, sorri da noite. Escondi estrelas... cadentes.

Debaixo daquela árvore eu pausei o tempo,

eu me dei um tempo, eu fumei um cigarro. Eu tossi mentiras.

Debaixo daquela árvore eu fui cético,

niilista, dadaísta, sádico em mim mesmo. Contemplei o mal.

Debaixo daquela árvore eu banhei no rio,

sujei as mãos, impurezei a alma e só mordi os lábios.

Debaixo daquela árvore eu ninei meus dias,

minha vida, nosso mundo, sonhos e fracassos. Tudo e nada mais.

Debaixo daquela árvore, fictícia e imprópria,

perfeita e precisa, essencial e mórbida, fria e acalorada,

urgente e esquecida, necessária e maléfica, bem e mal,

enfim...

A árvore da vida.

VALBER DINIZ
Enviado por VALBER DINIZ em 10/09/2010
Reeditado em 10/05/2011
Código do texto: T2489779
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