ACONCHEGO INVERNAL
Propícia manhã de sono
Não há céu pela janela
Pelas ruas, abandono,
E a brisa fina congela.
Retorna ao ninho a garriça
Calam-se vozes e trinos
Até os sinos da missa
Repicam roucos os tinos.
De tapa-olho e capuz
Dorme o sol às nove e meia,
A praça com pouca luz
Induz que o sol não clareia.
Calçadas mudas, sem pio,
Só uns dispersos garis
Palavras fumam de frio
Mesmo que nada se diz.
Manhã pra sonhar com ócios,
Reduzir o mundo ao nada,
Proibir-se fazer negócios
Dar-se inteiro à sua amada.
Quem tiver alguém que ama
É bom nem abrir o olho
E no aconchego da cama
Botar as barbas no molho.