«O único amor que quero...»

Leio este breve poema, nada lírico: «O único amor que quero / é o desobrigado. / O resto podem metê-lo / onde lhes couber.» Enviou Poeta Galega em 10/04/2009 06:07 para o texto: «Somos carne e pele» (T1530159).

E puxado por ele, quis escrevinhar um poema "bucólico". Mas antes, no Aulete, vi que "bu.co.li.co", sendo adjetivo, significa: «1 Ref. à vida e costumes dos pastores; PASTORIL: Seus quadros retratam paisagens bucólicas..- 2 Ref. à vida no campo, sua paisagem, seus costumes; CAMPESTRE.- 3 Que faz parte ou está próximo da natureza ou da vida natural.- 4 Que se identifica com os valores da vida no campo; que gosta da vida campestre: uma alma bucólica.- 5 Que exalta a vida campestre e as belezas do campo (poesia bucólica); PASTORIL.- 6 Singelo, ingênuo, puro.»

Sei que provém do gr. "boukolikós", pelo lat. "bucolicus".

Na realidade "boukolikós" deriva de "boukolós", guardador de bois, boieiro. Não obstante, cedo (bom, não sei se foi cedo ou não tão cedo) o adjetivo passou a qualificar relatos, poemas e outras expressões artísticas que procuram tratar inspiradamente a vida no campo e na Natureza.

Mas como, meus deuses campestres, poderei escrever um poema bucólico no meio e meio da cidade, de cimento e tijolos, sem bois nem boieiros (salvo que entendamos que os nossos governantes nos quardam como o boieiro aos bois...)?

E mais uma vez me senti impotente... Mas tentei. Eis o poema boieiro:

O meu amor é livre,

apesar de tudo:

Amo o que sou e o que não sou,

apesar de tudo:

Amo a mulher que me ama e a que não me ama,

apesar de tudo:

Amo o vento que me envolve nesta Crunha ventosa,

apesar de tudo:

Amo o mar que receio, frio e oceânico,

apesar de tudo:

Amo os peixes e as aves, encerrados e ceivos*,

apesar de tudo:

Amo o Sol ardente (dizem) e a Lua clara (quando está),

apesar de tudo:

Amo os cães e os gatos... os nossos gatos,

apesar de tudo:

Amo, agora, a música divertida que ouço,

apesar de tudo:

Amo, noutras ocasiões, a música clássica (Bach, Mozart...),

apesar de tudo:

Amo o que escrevo e o que não escrevo,

apesar de tudo:

(alarga-se no tempo muito mais o que não escrevo... sem dúvida!)

Amo os amigos e também (sou cristão, talvez) os outros,

apesar de tudo:

Mas sobretudo me amo nos anos perdidos

e nos achados!

O resto não tenho onde possa couber:

lamento-o. Irá ao lixo!

...

(*) "Ceivo, -a" adj. (1) Solto, livre: "anda ceivo". (2) Monte ou terras abertas para todos os vizinhos. (3) Aplica-se ao leite azedo: "este leite está ceivo". Vars. Ceiva, ceive, ceivia. (do lat. caelibu[m])