CANCER
Brincadeira de criança
pureza, vigor, despreocupação
se feita a lição de casa
com contentamento, doação total
podia brincar...
E menina célere
com bonecas sorridentes
em seus sonhos infantis
passava os dias em campos e panos
de um sonho feliz
O tempo passou...
Já não existia mais o sorriso maroto
infantil e feliz
A juventude maravilhada
Desabrochara
Naquela da sociedade...
E aconteceram muitas coisas
Nos bailes e nas festas
nos vidrilhos e vestidos
na juventude vermelha
e muito multicor
Tornou-se vida e felicidade...
Para a dama do clamor...
A dama trazia consigo
beleza e competição
Era a primeira a bailar
E o seu porte
fazia inveja nas outras
companheiras do lugar
Os manejos e brilhos
a boca suculenta
a sua natureza bela
Diziam
que dariam tudo para
estar no seu lugar
Nas madrugadas
O perfume da dama da noite
passa embaixo das janelas dos casarões
A menina cresceu...
Foram-se embora as bonecas
Foram-se embora os campos floridos
Choraram de desilusão
Pois nunca mais foram lembrados
O tempo passou
desprezou amigos, desprezou casamento
menosprezou pessoas e utilizou beleza
Mas o tempo passou
A dama já não é dama
a sua natureza enloqueceu
Comentam
Onde está?
A dama orgulhosa, dama do
perfume discreto
a moça bela dos bailes
aquela dos vidrilhos ofuscantes?
Não é possível
não pode ser
Aquela que tanto desprezou
tempos atrás
Agora
doença
queima seu corpo febril
ela está indo embora
tem poucas horas
para tentar ser feliz
Que diferença faz
já não pode ir aos campos
já não pode mostrar encantos
somente a cama lhe sustenta
sua competição natural
Tão jovem e tão linda
Não, respondem categóricos
a tristeza
mata um pouco e mais um pouco.
Ela morre
Morre com quem?
Sozinha?
Sem bailes e viários?
Hoje já não vive em paz
Procura velha boneca
pelo seu olhar aflito
Lembra-se de que
destruiu tempos atrás
Onde está todo mundo
Os empregados e parentes
pais e namorados
Mas não há ninguém...
Não teve
compaixão e coragem
para mover-se rumo ao outro
para cantar poesias
refutar o medo da caridade abnegada
da Palavra acompanhada de Pão
A dama da noite nunca procurou
"Amai-vos uns aos outros como eu vos amei".