Poesia Sem Nome

Trago na boca o hálito do poeta,

de saliva quente, de gosto amargo,

no lábio rubro donde tabaco pende

das palavras torpes e sem juizo

da vida, por fim, da vida.

Trago na tez a ferida do amor,

um branco alvo, uma maciez de seda,

da flagela estirpe da qual provém dor,

da podridão do tecido que um dia rompe,

na morte, quem sabe, na morte.

Trago nos olhos a ilusão dos sonhos,

num céu tão "blue", de pranto em chuva,

da onde a lágrima salgada perdura inerte,

da onde os sonhos de longe, nunca voltarão,

pra solidão, por fim, pra solidão.

Trago no peito o sentimento bandido,

que mente em prosa, que não me poupa,

da pulsão amarga de paixão sortida,

da volúpia intensa por mais uma sina,

sem mais doer, quem sabe, sem mais doer.

Trago nas mãos o sangue da esperança,

que bendita não é, que sempre nos frustra,

da onde pensamos ter sem nunca tocarmos,

da onde esperamos ir, sem nunca chegarmos,

em nenhum lugar, quem sabe, em algum lugar.

Por fim, inspiro com força o tédio tosco,

o desespero branco, do pranto, do rouco

de onde eu nem sei, e ninguém sabe,

da onde o fim, emfim, por demais tardou,

e a angústia solene se ergue altiva

à deriva da torpeza do pensador

saciando-se em solidão na sua rotina.

Uma vez vivo, tarde-se morto,

num pêndulo tosco que aponta a mina,

onde o ouro mais rico é o sonho,

da beatitude que é só minha.