O barulho do barco

* Em homenagem a

João Cabral de Melo Neto.

O barulho do barco

Rompe o silêncio do rio,

Assim como o rio

Rompe a secura do Sertão.

É espessa a secura da terra.

E é espesso o silêncio do rio.

Porém,

Mais espesso é o barulho do barco.

As palavras gritadas

São em vão

Nada se ouve, tudo é silêncio...

Interrompido e produzido pelo

Barulho do barco.

A voz do motor do barco

Silencia qualquer voz,

Ou barulho.

Menos o próprio

Barulho do barco

A voz da gente desse lugar

É pouca: pouco se fala

– a natureza deve ter sua parcela de culpa...

Assim como as pessoas

Pouco falam e muito dizem

Com seu silêncio,

Também o rio, com seu silêncio,

Diz muito.

Por isso é espesso

O silêncio do rio.

Espesso como os morcegos da capela

Da Ilha de São Félix,

Às margens do São Francisco.

O sol, aqui, também é espesso.

Como o silêncio das pessoas,

Como o silêncio do rio,

Como os morcegos de São Félix...

Porém, mais espesso ainda,

É o barulho do barco

Que cala como faca,

No bucho da lâmina espessa.

De Lâmina só,

Pari como feixo de luz

Solar no sangue das pedras

Silenciosas...

Espessas

Qual o barulho do barco,

A voz do barco...

Ou como o grito de motor

Que há em toda alma

Que trabalha.

André Raboni
Enviado por André Raboni em 04/07/2008
Código do texto: T1065027
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