Saudades de Ana (*)
Ontem,
No 21º andar,
Me lembrei de Ana Cristina (ou Ana C.)
Olhava o prédio ao lado
E o perigo solto no terraço.
Projetado à frente, no espaço vago,
Desenrolava-se o filme do incognoscível
- Antes censurado.
Do parapeito inquietante
À tela à frente, perguntei:
O que cercava a mulher?
“Bonita, inteligente, poeta”?
O que enxergava? O que cegava a mulher?
E imaginei,
No seu peito,
A fome do espaço projetado.
A brusca busca pela tarde,
Mais que tarde,
Arquitardia a sua busca.
A Bruta morte nos braços do seu arquimedo
Bruxa tarde
Morrendo nos braços do arvoredo.
E recobrei
A água no correr do rio
Homens jogando baralho, embriagados, pela margem....
E Ana ultrapassando a margem
Adiante do perigo e risco
Pro encontro da linguagem.
Mas qual linguagem?
De que linhagem?
Eu, pelo meu lado,
Lanço apenas poemas de amor
No espaço projetado
Na afim de me jogar.
Mas vivo a me indagar
- Em todo canto e nível –
Que preço foi pago para inocentar vadias
Inúteis vigias do inexeqüível?
Imagino-as travessas
Brutas, inocentes
Optando pelo risco
- Não pela catarse –
Observando o espaço a projetar-se
Do parapeito de Ana.
(*) do livro “O Velho Testamento”, ed. do autor, 1988. com alterações.