AMNÉSIA.
Adorava soltar pipa.
Ficava maluco. Não sabia o que era mais maneiro. Empinar a pipa ou correr atrás delas, quando caíam.
Uma loucura.
Caía no quintal do vizinho, pulava muro. Enfrentava cachorro e tiro de espingarda de chumbinho e de sal.
Cortava o pé em caco de vidro, mas chegava em casa com o troféu: uma pipa ou um pião (agente falava pião).
Passava cerol na linha, gilete na rabiola. Uma batalha de pipas no ar. Às vezes, e muitas vezes, a porrada comia no chão. Era um Deus nos acuda.
Agente vai crescendo e ficando rabujento.
Não entende mais a razão desses fetiches de menino.
Implica com a criançada, não devolve a pipa e rasga-a sem dó.
Que pena!
Agente envelhece e tem amnésia.