A BREVE HISTÓRIA DA MULHER QUE PROSTITUIU UM SONHO

Noite sem perplexidade.

Na dança do bolero que toca solitário,

distante dos braços da paixão em ausência,

Januária, de corpo nu nos vitrais da janela,

se toca solitária ferida pela masturbação...

A solidão ganhará a liberdade.

Os meses de aluguel aprisiona a casa,

a vontade de subir aos céus desperta filhos

da Januária, carente, louca e dependente

do despejo do amor suicida do algodão...

A noite calou o bolero.

A droga que caiu da lua, aparente poesia,

anestesiou a pureza do amor vivido pela casa,

fez Januária sem brilho, sem homem, antiga

ao se sentir devorada e só pela escuridão...

O dia, cúmplice da vida,

fez Januária fechar impaciente as janelas.

Sentiu outros cheiros, outras falas sem sentido,

discursou qual mulher em quase abandono

na emoção pouca de trair a parca solidão...

Sem mais nada a revelar,

nem para o dia, para a noite, nem mesmo para a solidão,

longe da casa de aluguel e dos deveres para com os filhos,

atenta para todos os fantasmas azuis mostrados na televisão;

Januária, longe do toque que um dia despertou seu corpo ao arrepio,

pediu para que o amor bebesse, bebesse, até que a noite pudesse cair

e que a madrugada lhe trouxesse alguns perfumes baratos e poucos cigarros

para que a noite atravessasse a rua do Amor que lhe engoliu profundos sonhos.

E, na sua última e desesperada fuga contra a solidão,

apesar de constatar que as mulheres da noite não conjugavam manhãs,

reencontrou um namorado antigo com carinhos de reserva

e amou os sonhos dolorosos que a noite lhe tirara!

Januária esperou a chegada do dia. Só!