Não estou
Procuro uma poesia antiga
Que vivia antes das taças de vinho
e dos teatros barrocos.
Procuro uma poesia que já estava
nos olhos dos macacos
quando se perceberam.
Procuro a poesia do homem,
A poesia de um jornal áspero
Que o leitor segura frente aos óculos.
Sim, a poesia dos óculos!
Objeto sem ternura que ameniza um desconforto
do homem sempre desconfortável.
Procuro e sei que há
Não os becos cheirando a rum
e os amores impossíveis.
Procuro amores somente improváveis
empoeirados pelo descuido nosso.
Procuro a participação de um leitor
que me ache feia e sem graça
ou terrível e desgraçada,
mas que pise as ruas de todos nós.
Procuro uma idéia pequena
que não esteja em mim.
Procuro João Cabral
E o incêndio dos confessionários.
Procuro o poeta em mim
e não o eu-poeta.
Procuro libertar a poesia
aprisionada no poema.
Procuro um artista menos egoísta
Que, estando em si, está-se;
não estou.