ITINERÁRIO (?)

Para este labirinto

somos todos minotauros,

místicos andejos

pisando sobre as próprias pegadas,

sem jamais atingir o rumo.

O que há para percorrer

senão este fio de linha

onde equilibramos os nossos pés-de-pluma

e vamos, trapezistas de ocasião,

carregando rota sombrinha?

Assim, a existência vai-se escoando

no plano do real

e se rasga, enfim,

a certidão de nascimento,

que nada mais é

do que o cartaz publicitário

que anuncia a próxima atração do circo,

onde todos somos personagens.

No mais, tudo é pantomima.

Talvez resquícios

dos bonecos de pano da infância,

seus olhos esdrúxulos e opacos.

Ou talvez contas de um rosário

de um pecador que se redime

aos olhos da própria consciência.

De resto,

ficam os olhos,

lamparinas errantes,

buscando o que se ama

– centelha que ofusca.

Palhaço triste é o Poeta,

que equilibra sua criação

em todas essas nuanças.

Este é, por condenação,

trapezista de profissão.

Ofício consciente

para travestir o real.

– Do livro O SÓTÃO DO MISTÉRIO. Porto Alegre: Sul-Americana, 1992, p. 87:8.

http://www.recantodasletras.com.br/poesias/911135