[Se me Descuido de Mim...]

Provocaste-me, respondo-te assim, ó:

não se aprende a sorrir, viu?

E isto, eu acho, não tenho certeza...

Se sorrio, é por que estou descuidado de mim,

estou de guardas baixas — ou não!?

Ao que me parece, eu sorrio sim,

apenas se estou a uma distância [segura] de mim.

[dizem-me que eu tenho um belo sorriso...]

Queria alguém que me fizesse descuidado —

descuidado de mim nos entardeceres,

nas madrugadas insones, ao primeiro canto do galo;

nas manhãs ensolaradas quando o gado já vai longe após a ordenha;

descuidado de mim quando a acauã grita desde a aridez da invernada;

descuidado de mim na florada do ipê solitário na paisagem...

Se me descuido de mim,

descuido-me do mundo, e então, eu sorrio;

ou será quando mais cuido é que me vem o riso?

Sei que só sou quando sou contigo,

quando sou com o brilho do teu olhar;

entretanto, ah, copo de veneno de vida! —

sei, mas também não sei, vou me perder,

o que é a alegria de simplesmente ser!

_________

[Penas do Desterro, 04 de março de 2008]