DIAS HÚMIDOS NA ILHA
José António Gonçalves
os plátanos choram os jacarandás
que lhes cantaram as horas matinais
durante incontáveis luas e muitos sóis
de antigamente
havia carros de bois passeando turistas
na placidez dos verões na avenida do mar
e uns barcos de cruzeiro lançando miúdos
às moedas na baía
cantava-se na rua e as floristas ajeitavam
ramos de antúrios e orquídeas com fitas rosa
brilhando nas mãos de quem sabe bordar
e nunca aprendeu a falar inglês
no Golden Gate cheirava a tabaco e a café
aromático do Brasil arrefecendo na mesa cheia
de conversa cinzeiros copos de brandy e jornais
sobre as cadeiras de vime cansado
os plátanos hoje choram os jacarandás ausentes
e não chove nem há brisa nos dias húmidos
da ilha tornando-os longos e sempre iguais
aos contos de Joyce no livro fechado
JOSÉ ANTÓNIO GONÇALVES
(inédito.25.07.04)