A NOIVA DE ABRIL
Desculpa, mulher amada,
se ontem, ao chegar em casa,
tinha as mãos cheias de calos vazios.
Fora como se não a olhasse atentamente.
Esqueci o abril e as flores,
o primeiro mês de compromisso,
como se o estar junto já se acomodasse.
Desculpa, mulher amada,
se nas trágicas noites de maio
as roseiras despelam inadvertidamente.
Fora como se eu a chorasse copiosamente.
Perdi o transe, o rumo da vista,
o beijo despregado na bandeira da porta
como se a minha chegada não mais a visse.
Desculpa, mulher amada,
se aumentei o volume do rádio,
dos programas da TV e da minha voz desesperada.
Fora como se eu não a escutasse atentamente.
Chorei, quase só, para não ter o consolo
da mulher de blusa rasgada, com seios em maio,
como se meu rosto, em colo, ouvisse seus silêncios.
Desculpa, mulher amada,
se aproveitei seu cheiro de noite
para sentir saudade dos tempos dos bailes de vinil.
Fora como se eu a conquistasse desdançadamente.
Respiro, já crescido, as marcas de mulher,
no corpo sem o modismos das saias curtas,
como se as coxas perdoassem as pernas do passado.
Desculpa, mulher amada,
se a temperatura cai em maio
só para desfraldar os amores quietos dos cobertores.
Fora como se o bolero não resistisse separadamente.
No dois-pra-cá dos que jamais se aproximarão
no dois-pra-lá dos que jamais se dividirão,
como se os lábios de maio não beijassem abril.
Desculpa, mulher amada,
se quieto, procuro sua quentura,
para que minha voz fale na sua respiração.
Fora como se o sono de toda ansiedade calasse.
Espontaneamente a porta se abrirá mesmo sem volta,
e, em comemoração, o nosso beijo sentirá o hálito farto
da casa em maio, dos tijolos montados: de nós em abril!