MEU NICHO

Minha morada é um apartamento de canto.
Privilegiada visão do parque. Um encanto!
Na copa das árvores vejo os passarinhos,
que no alto, como eu, fazem seus ninhos.

Foi e é pouso para muitos viajantes,
bailarinas, namoradas e estudantes.
Solteiros, separados ou em reconciliação,
artistas, poetas e os tocadores de violão.

Local de encontro para os reais e leais amigos.
Platéia pro futebol, mesa de almoço e jantares.
Confraternização da moçada aos domingos.
Palco de orgias, orações e de festas populares.

Vão amplo e vazado, janela a janela,
corredor ecológico de seres alados.
Fauna diversa o atravessa, diuturnamente,
exótica ou ecótipa, ou ainda, intermitente.

É meu posto de observação, e a vitrine,
ouço o vento e vejo criaturas multicores.
Canto de sopranos, barítonos e tenores,
chamada da alvorada pra que me anime.

Vejo no galho desfolhado logo ali,
canários, pardais, pica-pau e rolinha.
Mais adiante a gralha e um benti-vi,
sabiá, saíra, beija-flor e tesourinha.

Tico-tico, corruíra, tiê, juriti, sanhaço,
joão de barro, pombas e alma de gato.
Cortejo de acasalamento do par de anu,
bailam simulando dançar o maracatu.

Alimentam-se de frutos, durante o ano,
periquitos, as maritacas e até o tucano.
Vez por outra, também, dão o ar da graça,
curicacas, tangarás, os carcarás e a garça.

Há na mata, escondidos de quem olha,
jabuti, cobra, lagarto e galinha-d’angola.
Indesejados vizinhos alojam-se nas telhas,
são aranhas, marimbondo, vespas e abelhas.

O cair da noite traz-me certo desassossego,
tendo fresta, invade em vôo cego o morcego.
Ouço grilos, as cigarras e o coaxar do sapo,
escondidos pela escuridão, batem um papo.

Corujas atentas caçam a presa na lixeira,
as ratazanas robustas que derem bobeira.
Gatas e lobas formosas desfilam na trilha,
da janela, eu caçador, as enquadro na mira.

Há na mata, mais do que com olhos vejo,
a imaginação cria asas, imagem, lampejo.
Currupira, duendes, anjos, espíritos e saci,
seres irreais e mágicos, e o reino animal,
confundem-se em meu íntimo, por desejo.

Passa, como disse, tanto e tanto bicho,
muitos que se quer sei qual é o nome,
gente que não saberei dizer sobrenome,
diversidade que freqüenta o meu nicho.


                                                                             Fevereiro 2008