Ave, avestruz ! Os que vão correr te saúdam...
Euna Britto de Oliveira
Fiz mamadeira de feltro para aquecer um leite inexistente...
É imaginário o amanhã, tanto quanto o ontem.
Ninguém escapa da avalanche dos séculos,
Quanto mais o ovinho azul de anu que ganhei de presente,
Lá na infância...
Manchadinho de branco, foi só limpar com um paninho,
Ele ficou só azul, cor de um fusca azul.
E a ninhada de ovos roxos, de perdiz, os mais lindos que já vi,
Que alguém seqüestrou no campo e colocou sob uma galinha choca...
Nasceram avezinhas ariscas, geneticamente selvagens...
Uma rolinha fogo-pagou repete sua frase ancestral
E de vez em quando me assusta!
Minha sensibilidade a postos, escuto-a.
Ausculto o meu próprio coração.
Graças a Deus,
Tenho uma cabeça boa.
Tenho algumas coisas boas,
Inclusive a coragem de me expor à vida,
Sabendo que ela traz morte.
Morre um sentimento bonito,
Do qual zelei com fralda e talco,
Calor e carinho...
O que me espera no caminho?
Codorna ou codorniz?
Acaso, um casuar?...
Ema, seriema...
Ave, avestruz!
Teus ovos são enormes,
Tua velocidade, maior ainda,
E os que vão correr te saúdam!
É bom aninhar-me entre cobertores
Com esse quase frio forte.
Dá pra acarinhar sonhos...
Hein, vida?
É para a festa das sementes,
Essa que a morte detesta,
Que você me convida?...