A ARQUITETADA CASA-FELICIDADE
a casa está muda
apesar da tamanha felicidade.
Um disco antigo arranhado na vitrola
insiste em tocar nossa música tão nossa,
e ouve-se, e ouve-se
após tanto tempo sem haver o cantar
dos sons da palavra escrita...
a casa está muda
apesar da indisfarçável felicidade.
Vozes tão presentes de um passado
fazem burburinho em cada lugar, ou cantinho,
e falam, e falam
como se orelhas não mais ardessem
quando de nós mal cochichavam...
a casa está muda
apesar da incomensurável felicidade.
Nas árvores, acontecem passarinhos
barulhinhos de asas, palhas, tímidos gorjeios
ao pai, à mãe, ao perigo
como órfãos dos gritos calados
aprendendo a dor-de-fome...
a casa ficou muda
apesar da prova dos nove da felicidade.
Os travesseiros, agora, em cheiro par,
resolveram dormir bem, bem mais juntinhos
que antes, bem antes da muda casa
revelar o endereço ao carteiro
da cara-casa-metade.
surpresa, ela interinha ficou assombrada
e quase muda. Ah, tamanha felicidade!