O DOIDO DA MINHA RUA
o doido passa pela rua
- lá vai loló, lá vai loló –
a marmita e a vara
presa entre as mãos
- lá vai loló, lá vai loló –
o doido tem uma fita;
uma fita no pescoço do doido.
o doido carrega a cruz
na frente dos enterros.
- lá vai loló, lá vai loló –
o doido busca comida
na casa dos outros;
a marmita é prato de comida
nas mãos do doido.
o doido passa calado,
- lá vai loló, lá vai loló -.
o doido fuma,
cigarro de palha,
palha do milho
que leva no bolso.
meninos mexem com o doido.
meninos gostam
de mexer com o doido
- lá vai loló, lá vai loló –
o doido não tem casa
por isso mora no asilo.
o asilo é de velhos;
mas é de doidos também.
o doido passa pela rua
e não joga pedra.
- lá vai loló, lá vai loló –
o doido não xinga,
só quando mexem com ele.
o doido não mexe com ninguém
o doido não conversa com ninguém,
só fuma cigarro de palha.
o doido é, um doido,
um doido apenas.
- lá vai loló, lá vai loló –
abro a janela
mexo com o doido:
“me dá uma ‘paia’, loló;
sô orestes morreu!”
o doido vira doido mesmo:
“peste, diabo, capeta,
vai sombrá porco!
tem ’paia’ não, ‘injuamento’,
demonho!
vai bebê merda!”
fecho a janela
e fico rindo do doido,
que bate,
na primeira pessoa que encontra.
- lá vai loló, lá vai loló –
menino gosta de mexer com doido
doido bateu na ziquinha,
co’a vara, que tinha na mão.
ziquinha não mexeu com o doido;
só estava passando...
o doido é uma fita,
fita vermelha,
pendurada no pescoço.
é fita da irmandade!
da igreja onde o doido vai.
a vara entre as mãos
é pra bater em menino
que mexe e pede ‘paia’
e a marmita...,
lá vai buscar comida.
- lá vai loló, lá vai loló –
no outro dia
o doido passa.
o doido não lembra de ontem
passa e ri.
- lá vai loló, lá vai loló -
o olho dele é fechado.
deve ser por isso
que não lembra de ontem.