Somos Cativos

Somos Cativos

Criminosos de nascença

Réus das circunstâncias

Sem protestos ou apelos

Batizados com sentença

Julgados sem instâncias

Algemados sem clemência

De argumentos destituídos

Culpados venais inocentes

Condenados à obediência

Presos a ferros indolentes

Em caldeiras da aquiescência

Dos calabouços emudecidos

Somos tão só propriedade

Em inexorável escravatura

Latifúndios convenientes

Lavrados em fria escritura

Meros peões subservientes

Nos tabuleiros da sociedade

Somos presas da voragem

Das singelas hipocrisias

Nos banquetes moralistas

Servidos como iguarias

Para deguste dos sofistas

E deslumbre da vassalagem

Mesmo assim encarcerada

Trago no sangue o estopim

Em incansáveis rebeliões

Lidero o eterno motim

Recruto almas e corações

E a fera jamais amansada

Mordaças vazam o grito inteiro

Conclamo a implacável verdade

Com altivez assim tão bela

Invoco as luzes da liberdade

Sacudo forte as grades da cela

Fulmino o escárnio carcereiro

Paredes se aproximam, já perto

Tão lentas que causam torpor

Ecoa profundo a canção sorridente

Que do olhar alcança o torturador

Nem percebe que assim me liberto

Em nova forma a abster-me da dor

E etérea me dou -em gozo- ao universo.

Pacificada, enfim.

Assim, transparente...

[E diante do Nada, direi: "Eis-me aqui, vazia e pura.

Enfim aprendiz de teus silêncios ..."]

Claudia Gadini

09.12.05