muito prazer
Teu corpo não é mapa, mas bússola —
agulha imantada no meu ímã de sombras.
O deserto que traças em minha pele
é o mesmo que me ensina a sede.
Não há trilhas, só o rastro do vento
e a areia — essa língua ancestral —
que me lambe os ossos
e sussurra: "Aqui, tudo é memória
antes de ser carne."
Teu cheiro é breu e fenda,
éter que se derrama nas frestas da noite.
Tua saliva, um alfabeto de raízes,
escreve-me em vernáculo de terra.
Sou o que resta de um silêncio
que não coube em palavras.
Teus lábios — fronteiras do inabitável —
são o solo onde meu nome
germina em segredo.
A cada beijo, desfolho-me:
pó, depois vento, depois voz
que o teu corpo carrega.
És lua, sim, mas tua luz não fere —
despe.
Cada toque teu é um sol
consumindo-me em eclipse.
Quando me tomas,
o cosmos se recolhe
no gesto breve de teus dedos,
e o caos se faz canto.
Dentro de ti, há um rio mudo,
feito da matéria que antecede os deuses.
É dele que brota a língua
que tua carne recusa e revela.
Lá, sou o nada que transborda.
Tua árvore invisível me dobra os galhos,
seus frutos me embebedam de sumo e corte.
Cavo tua terra à procura
do grão que fundou o mundo —
e encontro, em vez de semente,
o grito que escorre entre meus dedos:
amor convertido em barro,
barro que se faz altar.
Tocas-me, e o tempo cede.
O abismo se abre em espirais.
Corpo teu, corpo meu —
lâminas gêmeas cravadas
no ventre do esquecimento.
O que nos resta é o estalo
da matéria se partindo,
o eco de um nome
que já não nos pertence.