Elevação
Elevaste-te sobre a relva,
nua, com o ventre em brasa.
O orvalho não era da noite,
mas do teu corpo aberto,
exalando sede e perfume.
Teus olhos — dois convites úmidos —
miravam o abismo,
não com medo,
mas com fome.
A solidão não te bastava.
Querias dedos que lessem tua pele
como um livro sagrado,
lábios que beijassem
a dúvida em tua nuca,
a certeza entre tuas coxas.
O tempo se desfazia entre gemidos,
a terra, quente, colhia teus joelhos,
e a boca que te encontrou
soube te nomear
sem nenhuma palavra.
Na pedreira, tua vergonha virou oferenda.
Ali, onde o mundo cede,
te entregaste à maré que te invadia,
teus quadris desenhando o templo,
tuas mãos puxando o tempo para dentro.
Toda passagem era tua.
A estreita, a larga, a secreta.
Tu eras o altar e o sacrifício,
o gozo e o grito.
E quando a chuva veio,
não era estação,
era teu corpo findando-se em prazer.
Chovia de ti.
Caminharás sobre a relva,
exausta e renascida,
sabendo:
nenhuma verdade é tão funda
quanto a língua que desce entre as pernas
para te lembrar que existes.
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Elevaste-te sobre a relva,
teu corpo, um presságio.
Teus olhos, faróis ofegantes,
não encontram a palavra
que umedeça tua sede,
essa que arde na solidão de um ventre não tocado.
Um vácuo te habita —
tempo e carne se desfazem,
e a face das coisas
são faces que se despem,
como a árvore se oferece ao vento.
Na pedreira abandonada,
teu sexo, curvado pelo medo,
mancha a vontade com o desejo
não dito — esculpido no escuro.
Nem todo mar acolhe navegantes,
mas teu corpo sonha com naufrágios,
com o sal que resta após a onda,
com a passagem estreita entre montanhas de calor.
Buscas o templo no outro:
na língua que se demora,
na mão que hesita antes de abrir o fruto.
Mas a verdade não está nos celeiros
nem no cetro que te promete calma.
Está na vertigem.
No capricho do espírito
que se encarna quando gemes —
imprevista e crua.
Ainda assim, caminharás sobre a relva,
mesmo ressequida,
com os lábios marcados pela última sede,
o inverno por dentro,
e a memória do gozo como luz.