ULTRAPASSAR O EU

Não quero estar à margem de mim.

Quero me despir do que é velho

E que impede que surja o novo.

Não quero estar à margem de mim.

Quero ultrapassar o meu eu

Como se ultrapassa um rio.

E ultrapassar um rio é enfrentá-lo.

É ir de encontro a sua fúria,

É nadar contra correntezas,

É correr o risco de perder a força

E não chegar do outro lado.

Mas melhor é correr o risco,

Que ficar a margem de mim.

Que ficar só a imaginar

O que tem na margem de lá.

Que mistérios se escondem ali?

Que segredos me vou revelar?

O que irei lá, eu descobrir?

Com que irei eu me espantar?

Será que conseguirei ver?

Será que vou suportar?

Mas quero correr o risco sim,

E esse rio transpassar.

Quero estar frente a frente a mim

E, os meus mistérios,

De mim não ocultar.

Quero o profundo do meu eu

Em mim mesma poder encarar.

Espantoso e assustador é,

Mas quero ultrapassar!

Quero chegar do outro lado

E com o meu ser defrontar.

E se mesmo ao chegar

Sem forças desfalecer.

Saberei que não vivi em vão,

Sentirei que grande renovação.

E, no meu desfalecer estarei eu

Diante de mim a me contemplar.

Desnuda dos meus mistérios

Diante dos meus medos,

Sem ocultar de mim meus segredos.

E depois da dura ultrapassagem

Se ainda forças tiver,

Enfim, feliz!

Buscarei saber o que fazer

Com o que achei de mim.

E se consegui descobrir

Saberei que outro rio furioso

Terei que enfrentar.

E o meu incansável desejo

Em ultrapassar meu eu,

Nunca, nunca irá findar.

Silvia Pina
Enviado por Silvia Pina em 24/01/2008
Código do texto: T830417
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