Solo Exposto
Oh terra minha! Que mão tão rude,
em tua face traçou feridas tão vastas?
Que ousado lavrador, sem temor ou medida,
rasgou teu manto, desnudou tua seiva,
e lançou-te ao sol como carne sem pele?
Eis-te agora, exposta, sem pudor nem defesa,
onde outrora dançava o verde —
a sombra das copas, o sussurro das raízes,
hoje jaz apenas o pó,
que ao vento se entrega como cinza de lembrança.
Nem chuva te sacia, nem sombra te cobre.
Foste deixada à mercê do céu ardente,
pisada por rodas, queimada por pressa,
esquecida por quem colhe, mas não semeia.
Oh solo outrora fértil, que retinhas as águas
como mãe que guarda o leite da vida —
agora és fenda, sulco, voçoroca,
abismo que o tempo cavou com lágrimas de barro.
As colinas te sangram em declive,
e tua essência, outrora firme,
escorre aos rios como lamento espesso.
E não há folha que te cubra,
nem raiz que te defenda.
De onde vieram os que te romperam?
Que lavraram teu ventre com sede de lucro,
e esqueceram que até a terra geme
quando perde o seu silêncio?
Das alturas, os orbes frios te contemplam —
ó olhos de vidro, satélites do juízo!
Veem em teus flancos despidos
as marcas do descuido humano.
Mas dizei-me vós, senhores da pressa:
até quando fareis da nudez da terra um hábito?
Não vedes que sem sombra, o mundo fenece?
Que até o chão, mesmo mudo, deseja ser coberto?
Oh se retornassem os musgos,
os capins tímidos, as folhas que abraçam,
os galhos que protegem e os ventos que respeitam!
Pois até a terra tem sua dignidade,
e sofre, como um velho rei sem trono,
quando é deixada exposta à ira do tempo
e à indiferença dos homens.