Queimadas
Que ruges, fogo voraz?
Que fome é essa que nem a chuva sacia,
nem o brejo resiste, nem o vento dissipa?
Vens com tua lâmina ardente,
com teus dedos rubros,
e tomas o que não te pertence!
O Pau-Brasil se curva, ferido,
o Pau-Ferro racha, estalando ao calor,
a Guapeba solta ao vento suas últimas folhas,
e o Mangue Vermelho, sufocado,
cede ao inferno que lhe abraça as raízes.
Na fuga, o Mico-Leão da Cara Dourada salta ao nada,
mas para onde ir, se o céu é fumaça?
O Jacaré de Papo Amarelo se lança à lama seca,
mas que refúgio há, se a água virou cinza?
A Onça-Pintada corre,
mas a mata que a escondia não mais existe.
O Guaiamum, outrora rei das marés,
jaz enterrado em pó e fuligem.
E os rios, antes vivos, arrastam a morte,
carregam em suas correntes
o que já não pode ser salvo.
Mas ai, os homens!
Que riscam o fósforo, que alimentam as chamas,
e em sua tolice murmuram:
"A terra renasce, a mata voltará."
Dizei-me, ó cinzas levadas ao vento,
quem disse que a mata esquece?
Quem disse que a terra perdoa?