Sombra de Alguém

Vi aí um espectro negro

Se arrastando pelo chão,

Quase mineral,

Como coisa cuja causa parece estar além

– ou aquém – de si.

Um vulto esguio e nítido

Feito somente de superfície:

Coisa igual à sua própria imagem.

Havia uma cabeça

Havia um tronco

Havia pernas

E mesmo assim não era completamente humano,

Quase mineral.

Grudado ao piso,

Refletindo aquele que o via

Fingia ser a aparência do outro,

Quando era muito menos:

Carne descarnada;

Avesso da luminosidade;

Tecido preto;

Casa por construir.

Andava na velocidade do movimento

daquele que passava (atrapalhando a luz).

Não era um anteparo humano,

Não dizia nada, não ouvia tampouco

Era quase igual ao chão mineral

Em todos os aspectos:

Uma sombra desconfiada

Ou uma pessoa bidimensional

De vitalidade pífia e sem autonomia,

Mas com gestos articulados e harmoniosos.

Mimetizava tão bem homem quanto bicho,

Seguia, pedinte, com toda a expressividade

Que um ser exclusivamente plano pode ter.

Inspirava medo, e ainda na memória persiste,

Estava vivo sem dúvida, precário:

Questionei minha humanidade

naquele relicário.

Danilo da Costa Leite
Enviado por Danilo da Costa Leite em 20/01/2008
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