Cheiro de saudade.
Quando pequena carreguei peixes ...
Baldes deles...
Minha mãe gostava de pescar.
Íamos cedinho nos fins de semana que eu não tinha aula para margem do Rio paraíba do sul...passavamos o dia todo e trazíamos pra casa porções de lambari traíras e mandis chorões.
Ela entendia de anzóis chumbada e linhas.
Depois com ela aprendi a carregar os pesos da vida.
As sacolas do mercado...
As sacolas da feira...
As dúzias de laranjas...
Os pêssegos ..
As carnes do açougue...
Com minha mãe aprendi bordar.
Crochetar...
Costurar...
Cozinhar.
Ela gostava das coisas no lugar
Mas não me obrigava ariar panelas
Nem a quarar as roupas
Ou ajuda lá com as compras.
Eu que corria atrás dela onde quer que ela fosse sempre curiosa prestativa e voluntária.
Eu aprendi ainda menina
Que o papel da mulher nesse mundo parece é um pouco mais pesado
Mas ela dizia que não..."meus meninos trabalham duro carregando grandes placas de vidros nas fábricas quando chegarem em casa estarão morrendo de fome"dizia ela e se apressava em cozinhar o feijão as batatas os peixes os pirões...
A carne seca..a feijoada...a rabada...os pimentões recheados... o doce de abóbora e muita canjica com amendoim torrado.
E me pedia com delicadeza que só queria que eu quebrasse o coco e ralasse ele todinho para ela poder colocar nos doces.
Não era fácil quebrar o coco....muito menos ralar eles todinhos...mas eu fazia com maestria... às vezes eu esbarrava o dedo naquele ralador antigo e enferrujado...
E dentro do coco ralado caia umas gotinhas de sangue...
Eu tirava depressa;pra ela não ver.
E continuava ralar...
Ficava orgulhosa pois era muito útil meu serviço prestado sem reclamar.
Sinto tanto falta dela.
Já faz vinte anos que ela se foi.
Mas ainda às vezes quando distraída que sou entre o real e o imaginário .. eu a escuto chamar meu nome.
Ah que pena logo fico até entristecida reparo que foi só um sussurro do passado que tem cheiro de saudade.