FIORELLO ABORRECE-ME

FIORELLO ABORRECE-ME

adormeço em frente ao ecrã do jornal

culpado de não ter nada de novo para contar,

as letras no meu sangue não correm para a minha aorta

segregadas como o Padre Ralph em Drogheda em Birds of Bramble,

Prometo que são as últimas, letras, como Jacopo (A)Ortis,

F.r.i.d.a. antecipa-me no sofá embrulhado no seu petit-gris.

Quando não se tem nada a dizer, o cursor bate em ritmo de blues

escrevendo à mão, pelo menos, morde-se a tampa do biro,

aparece um texto de inútil consistência De Signoribus, teclado

distrai-se, levanta-se, caminha, regressa, com a culpa de uma crosta,

da consciência de que escrever sobre nada é sempre escrever

surge a equivalência de que viver de nada é sempre viver.

Esta é uma oportunidade perdida para continuar a dar um sinal,

talvez seja um fragmento, anódino, ao estilo de Tomas Tranströmer,

Não me comovem as notícias, talvez seja a forma como uso o jornal,

como a areia para cães, a minha assinatura anual do Atelier expirou,

quem sabe, talvez sem me aperceber esteja a escrever uma obra-prima

como os biliões de escritores italianos com perspectivas pós-trabalho.

Hoje sinto-me anfíbio, meio Rottweiler e meio Chihuahua,

meio anfíbio, veículo blindado de assalto, na batalha de Okinawa,

experimentando a sensação dos comerciantes de Mondadori

de produzir palavras por encomenda, não me surpreende que se retirem

e se refugiem, aos pares, renunciando aos contratos fariseus,

para se afundarem, com a cultura do fazer, em La nave di Teseo.

Ivan Pozzoni
Enviado por Ivan Pozzoni em 23/12/2024
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