No portão

Chico volta quando quase deslembrado,

espantando em decorrência da magreza:

não se assemelha àquele, o demônio,

que pairava tão colosso sobre mim.

Eu poderia pegá-lo no colo.

Tem o cabelo penteado para trás

com entradas aparentes que me assustam,

olheiras profundas, feito vastos hematomas,

e um sorriso judiado — não só por fora.

Ele me fala dos robôs, não ganha aposentadoria,

é informal e nunca mais um empregado;

faz perguntas repetidas que respondo repetido,

dá conselhos que recebo, mas descarto.

Os minutos se acumulam e, enquanto o escuto,

estou pensando que esse homem já foi tudo:

tudo que eu jamais queria ser.

Mas a visão do destino comumente difere

e, no fundo, sei que sou mais Chico

do que reconheço ou enxergo;

vejo-o partir, do lado oposto do portão,

e me despeço.

Eu espero que ele chegue bem.

Rico Brugi
Enviado por Rico Brugi em 01/12/2024
Reeditado em 01/12/2024
Código do texto: T8209789
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