SERESTA DO HOJE
Eu, na minha limitação, quase humana, não tive o mérito de conhecer o belo que nasce nos olhos teus. Não compreendi o espírito flutuante nos corpos e nem tão pouco senti o calor, desses seus afagos, braços… ah, que abraços!!! Tão gostosos e por sinal, aconchegantes… Nostalgia, das melhores.
Eu, na tenacidade do entardecer… pôr do sol… mesmo causando uma síndrome, triste momento; busco transformá-lo numa música de amor, cantada pelas cordas de uma viola seresteira, embebecida de tanto amor… onde sua autoria anônima, deixava explícito o desejo de se declarar para a sua amada tão desejada.
Balbuciando de fininho e com uma ternura esplêndida… lá saia no dó maior,
o acorde de um pensador. Animado, aviltado pela regência de um maestro compondo em todas as línguas e dialetos. És uma musicalidade própria de quem tem tudo estragado no externo, mas que internamente, simplesmente ama na paciência, no desespero… no que não tem mais concerto, jeito de cicatrizar, mas, de se ré-citar em
ré maior tudo aquilo deglutido, em mi menor. Partitura? Parte dura.
Agora estou a sonhar? Por deveras!... Depois de anos de mudez e pesadelo, cá estou a busca na simplicidade do ato, aquele fato que construímos juntos. Penando, depenando e atrás do ganso, lá fora seu fígado transmutado em patê. E ela, tão ardil e encantadora não desiste… insiste em transformar tudo.
Viola, minha viola; cujas cordas enferrujam, porque meus dedos envelhecidos e enrijecidos não as orquestram mais. Restou-me saudades. Dessa musa que me inspira e que com suas doze cores em cordas, deixa nascer, transparecer o inevitável. Faz-me despertar para o hoje, já que o ontem negou-me a memória e o amanhã se tornou tarde demais.
E eu, atrás da colina, na minha velha casa de taipa, especada na fornalha, onde um bule de café amarga dita as batidas daquilo que clamam de meu coração. E no silêncio do anoitecer, já acabrunhado de cansaço. Tomo-a nos braços, como se ao leito fôssemos e pela última vez canto nas duas últimas cordas esse meu velho acorde.
Adeus minha amada. Não sei se encontraremos de novo. Mas, saiba, que não a esquecerei jamais. Sou teu braços e teu corpo é meu calor e apesar do ar sombrio que nos inebria… fique fria… estou bem. Aqui, bem do lado esquerdo do meu peito, ouço de fininho… bem baixinho faço minha última festa e dou uma gargalhada.
Dó ré mi fá sol lá si dó.
Boa noite. Pois o amanhã não voltará.
Dó si lá sol fá mi ré dorme.
Suspirei… terminei, findei.
Ei!
Editada em 10.01.1993
Reeditada em 24.09.24
Eugênio Costa Mimoso.