Noturno
A cigarra canta entre a paisagem,
Aviso que a primavera chegará sem chuvas
Na próxima mudança de lua, quem sabe?
Em tempos mais áridos, a solidão envelhece um pouco o olhar
Deixa ao ar uma moldura amendoada...
Há naturalmente um silêncio um pouco mais profundo ...
Percebo que minhas roseiras atrasam os botões
O pequeno canteiro de ervas precisa de cuidados
Alguns pássaros atrasaram a migração
Na água que corre mais fina, ao fundo do roseiral
O poente avermelhado, anuncia noite fria e estrelada
E que amanhã será um longo dia de sol
Um longo dia de sol...
No conforto da antiga cadeira em madeira maciça, observo a noite
vejo a dança das nuvens, os desenhos que formam no céu,
o chá de capim-santo adocicado levemente com mel
acendo um cigarro, lembro em silêncio antigos poemas
alguns em voz baixa, deixo fluir várias vezes pela amplidão
como se os oferecesse ao arrebol...
há muito percebi em mim, como poeta, o alvorecer da quietude
um outro prisma da poesia, um aspecto mais maduro da sensibilidade
por isso o hábito de repetir poemas antigos
enquanto sirvo-me de outra xícara, e protejo-me com o cachecol
a cigarra ainda canta entre as paisagens,
amanhã será um longo dia de sol
um longo dia de sol...
Tonho França