Balada do Tempo
Sofrer o tempo é nele estar
Entrar no tempo é ser.
E ser no tempo é dissipar-se,
Em fumo evanescer...
Nascer pequeno e vir banhar-se
Nos rios do vir-a-ser.
Brotar semente e conformar-se
À lei do florescer.
No coração sentir que arde
O sonho de crescer.
Para no tempo desvendar-se
As tramas do viver.
Na ampulheta investigar-se
As mil razões do ser,
Vendo o mistério transformar-se
Em grãos a escorrer.
Na imensidão e nos alardes
Da turba, achar-se só.
Na interminável soledade
Da escada de Jacó.
Do longo sono despertar-se
No sino das seis horas...
E ponto a ponto costurar
Retalhos de memórias.
Perante o trono confessar-se
Culpado do libelo,
Quando encontrar-se face a face
Com o tempo e seu martelo.
De um velho rosto recordar-se
No turbilhão das águas
E descobrir que alguns olhares
O tempo não apaga.
E suportar ao fim estrada
A última lição:
Da flor sem culpa estraçalhada
A exalar perdão.
No aquarelado fim de tarde
A brisa ouvir dizer...
Enquanto é tempo estude a arte
De amar e de escolher.